Foi uma tarde de 29 de junho de 1889, que apesar de ensolarada, deixava vazar um vento frio e incômodo.
Pela estradela da Fazenda Boa Vista circulava um carro de boi cantando.
A frente, como candeeiro, o menino Pedro, filho da viúva Constância, conduzia os bois com alegria e maestria, divertindo-se com as travessuras de seu cachorrinho, inseparável acompanhante.
No carro, sentado sobre a carga, vinha Teodoro, o carreiro, homem insensível às belezas da estrada, ruminando constantemente o que tinha de mais visível: mau humor.
Num repente, dando falta do picuá com seus pertences, parou o carro, saltou e partiu em direção a Pedro, acusando-o de roubo!
Surpreso, indefeso, com os olhinhos arregalados, o pequeno afirmou que não roubou e nem mesmo sabia.
Desafiado, possesso e incontrolável, o carreiro avançou sobre o garoto e espancou-o até a morte.
Ciente da barbaridade cometida, abusou do sadismo, pendurando o frágil corpinho com um cipó, à beira da estrada, num galho qualquer desde que simulasse um suicídio.
Tocou os bois seguindo viagem e, indiferente ao fato, nem notava que as rodas não mais cantavam.
Constância preocupava-se pois a lua já havia surgido e seu filho ainda não chegara.
Angustiada, meteu-se pela noite porém as trevas não traziam nenhuma informação.
Caminhando tresloucada, assustou-se com algo que puxava a barra de sua larga saia: voltou-se e reconheceu o cãozinho que tentava arrasta-la insistindo para que Constância mudasse de direção.
Ela deixou-se levar pelo animalzinho que tudo assistira e erguendo a fronte, deparou com o que nunca imaginava ver.
Dependurado, sem vida, alumiado por uma réstia de luar lá estava seu filho.
Estremeceu, vacilou, lutou para suportal a carga de dor que só uma mãe escolhida a suportar.
Reuniu forças, desceu-o, trouxe-o junto ao peito e convicta entre soluçõs, jurou que as mãos assassinas haveriam de secar!
Ali fincaram uma cruz, a “Cruz do Pedro”.
Não foi preciso mais do que uma fase da lua para que as mãos do carreiro Teodoro mirrassem até secarem por completo…
Passava-se o tempo mas o fato parecia sempre recente.
As visitas ao local eram constantes e fervorosas.
As graças alcançadas ali passavam a fazer parte daquelas que buscacam o alívio que a fé indiscutivelmente traz…
No lugar da cruz, foi erguida a capela.
Avolumou-se de tal modo, que no início do século XX, o dia 29 de Junho passava a ser festivo para os dois Pedros: o apóstolo de Cristo e o filho de Constância.
Na madrugada de 28 para 29 de Junho de 1938, Antonio Rodrigues Nunes, morador e devoto, organizava o terço e a procissão que até os dias de hoje reverenciam, saúdam e homenageiam o pequeno mártir da Fazenda Boa Vista.
“Pesquisa, elaboração de texto e ilustração feitas pelo escritor e poeta Adalberto Antônio Erbetta.”
Agradecimentos
Em memória de Antonietta de Aguiar Junqueira (Dona Netinha), que não só abriu as porteiras da Fazenda Boa Vista, como deu inteiro apoio à elucidação dos fatos, atestando a sensibilidade, adminiração e respeito às manifestações de fé do nosso povo. Dos saudosos; José Luiz Nunes Filho (Zezinho), Dona Alice Rodrigues Nunes e José Carlos Gonçalves (Zé Goleiro). Agradecimentos a: Luiz Carlos Selli, gerente da Fazenda Boa Vista, moradores e funcionários que permitiram, com depoimentos sinceros a proximidade, da veracidade e autenticidade dos fatos.